terça-feira, 12 de agosto de 2014

Aurora luzidia

O pau bate na perna, que bate no cepo, que bate no cavalo, que bate em disparada campo a fora. Vovó vê a uva. Vilma vê vovó ver a uva. Tício vê Vilma ver que vovó vê a uva. A uva mesmo nada vê, que não é de ver. O sol vai dizendo tchau, eu mesmo vou dizendo o tchau do meio dia às sete da noite. O crepúsculo é nosso inimigo, imita o dia claro, mas é o despertar da noite. Ele não é nada e é tudo, é dia e noite fazendo amor ao largo, lá onde o mar encontra o fim do mundo. Esse fim do mundo é agora, já, neste instante fugidio, perdido como nenhum outro, jamais compreendido. Não sabemos entender o fim do mundo, do começo temos vagas notícias. Azul era o gato, disseram. Azul o cavalo, disseram também. Isso e outras insolências, que todos tendemos a esquecer. Meus ossos doem hoje porque aprenderam a anunciar, a traduzir as cismas caladas do universo. O universo não é muito de falar, é de ir lá e fazer, muito impulsivo que é. Nada avisou antes de acabar completamente.
E a ordem? Morreu, afinal, com ele. O dia está morno hoje, todo sem graça. O café azedou porque ousei pingar uma gota de leite azedo. Daria tudo aos porcos se os tivesse; assim joguei na pia mesmo. A chaleira fez o seu chio porque resolvi querer chá. Grunhiu como um animal ferido, hostilizada pela pressão, pelo vapor e pelo calor que chegou ao som de trombetas. São esses dias de manhã, essa matina exigente. Se voltar a dormir melhoro, já aprendi isso. Mas o fato é que não podemos voltar a dormir, pra frente é que se anda. Perco, então, meu tempo acordado, desperto. Desperto, desperto mesmo não.

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