segunda-feira, 24 de janeiro de 2011

O mundo precisa de Filosofia?


Tradicionalmente conhecida pelos raciocínios e métodos arrojados e complexos, a Filosofia passa por um momento histórico novo. Não se pode ainda saber se se trata de algo melhor ou pior, mas, aparentemente, se desenvolve uma mudança estrutural e paradigmática na forma de se fazer Filosofia. Essas mudanças não são novas na tradição filosófica. Durante o desenvolvimento de escolas e períodos filosóficos específicos, a maneira com que se percebia a atividade humana frente ao conhecimento, à moral, etc., fundava uma variante em relação aos momentos predecessores, acrescendo a esta percepção orgânica as especificidades do momento histórico vigente.
Sob essa ótica da variação espacio-temporal, a Filosofia registra uma identidade entre o pensamento e a estrutura político-social de determinado período. Nesse sentido, a atual maneira de se desenvolver o pensar filosófico parece mesmo se assentar à maneira com que as pessoas atuam na sociedade e nos contextos acadêmico-científicos. Ou seja, a Filosofia vai ao encontro da sociedade e pode ter dois comportamentos distintos e quase que paradoxais: seguir a lógica vigente ou contorná-la, denunciá-la e dizer sobre sua insuficiência.
Todavia, a tarefa filosófica é eminentemente crítica e reflexiva e, diante dessas características, isso significa uma resistência às condições e métodos pelas quais a sociedade atual se desenvolve (primeiro comportamento). Ou, doutra banda, a incorporação dessa prerrogativa social, fazendo com que se dissociasse daquela sua natureza crítica e reflexiva (segundo comportamento), porque isso importaria uma manifestação real frente às dissidências políticas e sociais.
Sob esse contexto, aquela nova versão para a atividade filosófica é justamente uma identificação entre a atitude do filósofo e o comportamento dos indivíduos; ou seja, o novo comportamento parece dizer respeito a uma diminuição da postura tradicional do filósofo. Parece, então, uma filiação ao segundo comportamento. Assim, a preocupação norteia-se por um viés demasiado especulativo quando, em paralelo, se desenvolve um contexto real de supressão das condições objetivas da cidadania, direitos fundamentais, pautas ecológicas, etc.
Diante da facilidade de se lidar com problemas metafísicos e exteriores, a existência do mundo real é um signo comparativo para a atividade teórica da razão, do concurso de ideias, da formação de um sistema capaz de dar conta das inquietações filosóficas. Representaria, assim, a desistência da Filosofia em lidar com a oposição à tradicional exploração física e ideológica.
Por outro lado, a inclusão da Filosofia como disciplina obrigatória para a formação média dos indivíduos fez com que fosse, então, visada como um meio possível e objetivo de se consolidar uma atitude crítica e reflexiva diante do amortecimento social. Ou, então, simplesmente como uma forma de se tratar a história humana por um viés diferenciado, o que, então, não reduziria a sua postura inerte e especulativa. Esse itinerário (entre os comportamentos possíveis) depende, então, fundamentalmente, da formação acadêmica do filósofo, ou seja, o quanto o acadêmico é instigado a ler os contextos em seu interior, percebendo as máculas e as estruturas que jazem sob determinado plano econômico, determinada forma de geração de empregos, das maneiras de se vender educação, etc.
Assim, o ensino acadêmico de filosofia que mitiga a atitude reflexiva é sem efetividade, ou, o que é o mesmo, a redução da Filosofia à História da Filosofia. Dizer que o mundo precisa de Filosofia não é somente explicitar uma necessidade exterior em busca de sentido, mas, sobretudo, desdobrar os sentidos e as representações que se apresentam como sendo as corretas e verdadeiras. Às instituições de ensino de Filosofia resta uma pergunta: o que estão fazendo da Filosofia? Quanto às demais formações profissionais, a resposta já foi dada com a adoção de um saber estático e anti-reflexivo, porque, afinal, nenhuma empresa quer um revolucionário e crítico social. São recrutadoras do mercado de trabalho, e, num mundo assim, realmente não há espaço para a Filosofia.
João Gilberto Engelmann

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