Como é possível exigir civilidade e ética ante à fome e à miséria?
Não é. Simplesmente não é possível, porque diante dessas coisas quase tudo é permitido. Como não seria? O que se deve esperar de alguém que se vê diante da morte iminente do filho, por fome, por doença, por sede? Do que vale a reflexão moral? De nada, não vale de nada. A necessidade extrema, circunscrita no vale onde mora a vida humana, anula qualquer moralidade. O estado dessa necessidade é a única moral existente. Roubar, matar, ferir, mentir; tudo isso se torna permitido. Tudo isso perde a incompreensão e já não é mais passível de reprimenda, de coação, seja legal ou não.
Somente dentro da vida regular, com condições, a ética faz sentido. No mundo extremo da fome, do instinto de proteger os filhos, a ética está dispensada, e as condutas se liberam. Por quê? Por a vida não possui padrões morais certos quando a morte deve ser evitada.
E, ainda, antes desse limite, dessa extremidade, o que nós fazemos e chamamos ética é perda de tempo, é hipótese. A conduta premeditada por um reflexão ética profunda é seca, estéril. Só faria sentido se pudesse estancar o transcurso do tempo, a circunstância que a exige; mas isso não é possível, e nenhuma grande reflexão é possível ante um grande ato de violência.
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